Artigo escrito pelo Dr. Diego Zanotti Salarini, médico neurologista do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, do Hospital das Clínicas da FMUSP, e da Santa Casa de SP, e gentilmente cedido pelo mesmo para publicação no blog.
Olá, retornamos ao tema de
Esclerose múltipla (EM), agora falando sobre o seu diagnóstico. Na sua denominação, a EM já
caracteriza sua principal característica – a ocorrência de sintomas em locais
variados no sistema nervoso central (cérebro e medula), terminando com o aparecimento de
cicatrizes (a esclerose), sendo ela a doença desmielinizante (isto é, que atacam
a bainha de mielina, a substância que envolve os axônios e dendritos dos neurônios). Observe abaixo:
http://www.saudecominteligencia.com.br/imagens/esclerose.jpg |
O PROCESSO DIAGNÓSTICO
É de extrema importância que a
história clínica (conhecida por nós como anamnese – em grego, trazer a lembrança) seja
compatível e tenha algumas características peculiares, como cada surto (o conjunto de sinais e sintomas da esclerose múltipla) durar mais de 24
horas, ser de uma localização mais comum (vide tabela abaixo), ocorra em
pacientes jovens, na sua maioria de ancestralidade européia (o que no Brasil
chega a ser quase impossível afirmar ou não visto nossa miscigenação).
Os sintomas mais comuns para se
iniciar são: neurite óptica (inflamação do nervo óptico), ataxia
(incoordenação), hemiparesia (fraqueza de um lado do corpo), hemi-hipoestesia
(perda de sensibilidade de um lado do corpo ou rosto), mielite (inflamação da
medula espinhal). Ainda há outros sintomas um pouco mais raros mas deixemos de
lado nesse momento. Observe abaixo os locais que podem ser afetados pela esclerose múltipla:
LOCAIS ONDE PODEM APARECER AS LESÕES DA ESCLEROSE
MÚLTIPLA E SEUS SINTOMAS
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NERVO
ÓPTICO
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CEGUEIRA
OU TURVAÇÃO DA VISÃO DO OLHO
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CEREBELO
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INCOORDENAÇÃO
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ENCÉFALO
(FRONTAL)
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PERDA DE
FORÇA
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ENCÉFALO
(PARIETAL)
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PERDA DE
SENSIBILIDADE
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ENCÉFALO
(OCCIPITAL)
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ALTERAÇÃO
DE VISÃO (CAMPO VISUAL)
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TRONCO
ENCEFÁLICO
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VISÃO
DUPLA, FALA ARRASTADA, ESPASMO FACIAL, NEURALGIAS
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MEDULA
ESPINHAL
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ALTERAÇÃO
DA MICÇÃO, PERDA DE FORÇA NAS PERNAS, PERDA DE SENSIBILIDADE NAS PERNAS
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Como mencionado anteriormente, os
sintomas têm que durar mais de 24 horas, o que chamamos de surto (não acho essa a
melhor palavra, mas é a mais difundida – acho que ataque ou crise ou até mesmo
manifestação seriam melhores, mas fazer o que...).
Agora pensem: todos
esse sintomas só ocorrem na EM?
CLARO QUE NÃO!!!!!!
Nesse ponto entra a expertise do
médico para saber reconhecer que existem outras possibilidades (segue o ditado
– nem
tudo que reluz é ouro). Um AVC, uma meningite, uma doença metabólica ou
nutricional, uma doença reumatológica ou até mesmo outra doença desmielinizante
podem ter os mesmo sintomas, e com isso os tratamentos são COMPLETAMENTE
DIFERENTES!!!
Após toda a avaliação clínica do
paciente, nós médicos usamos métodos diagnósticos para descartar ou confirmar uma
hipótese. No caso da EM temos um armamentário amplo para detecção: ressonância
magnética, liquor com pesquisa de bandas oligoclonais e os potenciais evocados.
Na outra face da moeda temos os que excluem outros diagnósticos possíveis:
dosagem de vitaminas, marcadores reumatológicos, pesquisa de infecções, exames
de vasos, dosagens de metabólitos. Após ponderar esses achados montamos uma
possibilidade diagnóstica para EM.
Oberve abaixo:
http://www.doutorcerebro.com.br/portal/images/stories/MS_mri2.jpg |
Esta imagem de ressonância magnética mostra o cérebro com várias lesões esbranquiçadas dispersas pela substância branca (as bolas brancas e brilhantes de cada lado). Estas imagens são desmielinizantes e inflamações cerebrais que podem caracterizar as lesões de EM, mas podem ser vistas em outras doenças também.
http://99.img.v4.skyrock.net/996/todosporcausas/pics/2405129395_small_1.jpg |
Já aqui temos uma imagem de ressonância magnética da medula do pescoço, a medula cervical, mostrando nas setas vermelhas pontos esbranquiçados na mesma, inflamações provavelmente causadas pela EM.
OS CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
O aprimoramento do diagnóstico
foi seguido por sua padronização, formando os critérios diagnósticos. Vários
pesquisadores (Poser, MacDonald, Barkoff, Paty, Swanton) desenvolveram e
aprimoraram os critérios desde 1983 até 2010, com o intuito de melhorar o
diagnóstico e até antecipá-lo, quando possível.
Temos que levar em consideração:
1) número de surtos (novamente essa palavra...), 2) alteração de ressonância
(número de lesões e suas localizações e 3) Bandas Oligoclonais. Montando um
quebra-cabeça com essas informações podemos sugerir ou não o diagnóstico.
Em um próximo post discutiremos
sobre sintomas específicos da EM. Até lá!!