sábado, novembro 30, 2013

Sorteio do livro Ausência

O sorteio do livro Ausência produziu a seguinte ganhadora:

Professora Cristiane Cassaniga.

Parabéns, Cristiane.

Mande seu endereço para o e-mail sekeff@hotmail.com.

Mandaremos o livro essa semana, e o frete é por nossa conta.

quarta-feira, novembro 13, 2013

Mais sobre a substância cinzenta cerebral

Além do que já foi discutido no post anterior sobre o córtex cerebral, há no cérebro ilhas de neurônios, cuja função é filtrar tudo o que entra de informação no cérebro (odores, gosto, tato, sons, visão) antes de encaminhar as informações ao córtex cerebral para análise mais aprofundada, e refinar os movimentos produzidos no córtex cerebral, de forma que consigamos realizar movimentos grosseiros e finos com total harmonia e delicadeza.

Estas ilhas de neurônios são os núcleos cerebrais e de tronco cerebral.

Há vários destes núcleos, de forma que a substância cinzenta cerebral não está somente cobrindo a substância branca, mas se encontra dentro dela também.

Os principais núcleos são:

Os núcleos da base - Putâmen, caudato, globo pálido, substância negra, núcleo subtalâmico (leia mais sobre eles aqui).

O tálamo (leia mais sobre ele aqui).

O hipotálamo (leia mais sobre ele aqui).

Os núcleos do tronco cerebral - Aqui há vários agrupamentos nucleares de neurônios dentro do tronco cerebral, cujas funções são as mais diversas, dentre movimentação dos olhos, controle da respiração, do ato de engolir, da movimentação da língua e da boca, da sensibilidade espacial (localizar-se no espaço com os olhos fechados), da sensibilidade da face, entre outras funções.

Veja abaixo:

http://bradyonthebrain.files.wordpress.com/2013/10/cranial-nerve-nuclei-in-brainstem-schema-2.jpg
Acima você vê os nervos cranianos motores (em vermelho) e sensitivos (em azul) com seus núcleos (as expansões dos nervos dentro do tronco cerebral).

http://bedahunmuh.files.wordpress.com/2010/05/cranial-nerve-nuclei-in-brainstem-schema-1.jpg
Acima, a mesma figura vista de lado.

Há vários outros núcleos no tronco cerebral, dos quais falaremos após. 

E há os núcleos do cerebelo, claro:

http://kin450-neurophysiology.wikispaces.com/file/view/19.1.jpg/140453055/411x326/19.1.jpg
Acima, uma visão do tronco cerebral e do cerebelo por trás. Os núcleos cerebelares estão à esquerda, em roxo (núcleo fastigial, emboliforme e globoso (juntos foram o núcleo interpósito) e o núcleo denteado).

O córtex cerebral

A porção mais externa do cérebro, e que o envolve como uma malha, chama-se de cóirtex cerebral. A palavra córtex vem do latim cortex, que quer dizer "casca ou carapaça" (leia aqui).

O córtex é também chamado de substância cinzenta, por conta da cor meio marrom-acinzentada que ele apresenta nas preparações cerebrais (veja abaixo).

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0c/Human_brain_right_dissected_lateral_view_description.JPG
Observe que a substância branca (a parte interna do cérebro) é toda coberta por uma capa que é facilmente distinguível, a substância cinzenta ou córtex cerebral. Apesar de possuir milímetros de espessura, o córtex cerebral possui 6 camadas entremeadas de neurônios e de fibras (axônios e dendritos), que ora saem destes neurônios para outras áreas do córtex e estruturas mais profundas do cérebro, ora chegam de várias regiões cerebrais a estes neurônios.

Observe as duas figuras abaixo, que mostram o seu córtex cerebral visto ao microscópio. 


http://thebrain.mcgill.ca/flash/d/d_02/d_02_cl/d_02_cl_vis/d_02_cl_vis_3a.jpg
http://chronopause.com/i293.photobucket.com/albums/mm55/mikedarwin1967/Feline-62a.png

Observe a quantidade de células e de fibras que sobem, descem e correm paralelamente à superfície do cérebro. São bilhões de fibras e células neuronais, associadas a células gliais de suporte e manuntenção da eletricidade cerebral, que juntas realizam toda a transmissão cerebral elétrica.

O córtex cerebral é completo, desenvolvido, e permite a integração entre várias regiões cerebrais distintas e a integração entre o próprio córtex e os núcleos de substância cinzenta existentes na profundidade do cérebro, o cerebelo e a medula espinhal.

Sem esta malha altamente intricada de fibras e células, nunca conseguiríamos o avanço científico, tecnológico, de linguagem e social que possuímos hoje.

Estudos demonstram que os animais mais próximos de nós, como macacos e outros animais como cachorros, porcos e gatos, possuem também córtices (esse é o plural de córtex) com 6 camadas, semelhantes ao nosso. 

A diferença é que nosso cérebro é disposto em inúmeras colunas de células ao longo das camadas, em número muito maior que nos outros animais. Ou seja, células que pertencem a camadas diferentes conectam-se entre si verticalmentem, formando colunas que servem para ações específicas dentro de uma região cortical. Há colunas celulares que são ativadas pela visão de linhas e bordas, outras são ativadas pela cor, outras que são ativadas pela visão de movimento, e assim vai, ao longo do córtex cerebral, de tal forma que uma função é trabalhada em partes, ao longo de várias camadas celulares, em várias colunas, tornando a análise e percepção do estímulo mais completos e complexos. 

Observe abaixo:

http://www.fizyka.umk.pl/~duch/ref/00/00-how-brain/column.gif
A figura acima, que demonstra a conexão e a passagem de estímulo entre várias células, demonstra à esquerda três colunas de células corticais. As colunas possuem, cada uma, as 6 camadas corticais, mas separam-se através de minúsculos espaços. As colunas são interconectadas entre si, permitindo a células que respondem a um estímulo conectar-se com células nas proximidades ou à distância que respondem a outros estímulos, de modo a tornar a percepção de estímulos algo bastante completo.

Ou seja, seu cérebro é todo conectado, tanto de cima para baixo e de baixo para cima, como de frente para trás e entre os lados. 

segunda-feira, novembro 04, 2013

Por que ocorrem as crises epilépticas? - Uma visão direcionada ao leigo.

Vamos tenta tornar o complexo simples.

Nosso cérebro, como todo o nosso corpo, funciona através de correntes elétricas minúsculas (cujas voltagens são medidas não em Volts, mas em miliVolts, que são 1 Volt dividido por 1000) produzidas por trocas de íons, átomos eletrificados. Os dois íons (átomos eletricamente carregados) relacionados à produção de energia elétrica na célula são os sódio (Na) e o potássio (K), que são íons positivos (cátions), ou seja, que necessitam de um elétron para alcançar a neutralidade elétrica. Outros dois íons são importantes, o cálcio (Ca) e o cloro (Cl). O cálcio é um íon positivo que necessita de dois elétrons para sua neutralidade, e o cloro é um íon negativo, ou um ânion, que necessita doar um elétron para alcançar a neutralidade elétrica.

Nas células, o potássio existe em maior quantidade do que o sódio, que abunda nos espaços entre as células (extracelulares). Da mesma forma, o cálcio e o cloro são mais importantes fora do que dentro da célula. Nas células, ocorrem alterações de trocas entre o sódio e o potássio que não chegam a produzir uma corrente elétrica (o sódio entra e o potássio sai da célula, mantendo assim o potencial, a diferença de carga entre o dentro e o fora da célula, que é de - 70 mV, ou seja, a célula é negativa em relação ao meio onde ela está). No entanto, quando estas trocas de íons são grandes o suficiente, há a produção de um potencial de ação, que é justamente a maneira como as células em várias regiões do corpo se comunicam e trocam substâncias entre si (leia mais sobre o potencial de ação aqui).

Um neurônio é uma célula ultraespecializada em conduzir estímulos elétricos (potencial de ação) através de suas ramificações (dendritos e axônios - leia mais sobre isso aqui). E há vários tipos de neurônios, que produzem e transmitem várias tipos de substâncias que agem em vários locais diferentes.

Como já falado em post sobre as sinapses neste blog, os neurônios se comunicam através destas pela abertura/fechamento e estimulação de proteínas localizadas nas membranas celulares, os receptores. Vários receptores existem, e cada um deles sofre alteração por contato e ligação com substâncias chamadas de neurotransmissores.

Da mesma forma, há centenas de neurotransmissores diferentes, mas os mais importantes são:

1. Dopamina
2. Acetilcolina
3. Serotonina
4. Noradrenalina
5. Substância P
6. Encefalinas
7. Ácido gama-aminobutírico (GABA)
8. Glutamato
9. Glicina

Há vários outros neurotransmissores. Alguns destes inibem a ação dos neurônios onde agem (neurotransmissores inibitórios, como a glicina e o GABA) e outros estimulam os neurônios (os neurotransmissores excitatórios, sendo o mais comum o glutamato).

Os neurônios GABAérgicos (que contêm GABA) são assim didaticamente chamados de inibitórios, e os que contêm glutamato (glutamatérgicos) de excitatórios.

Muito bem, entendendo até aqui? Vamos continuar.

Como falei antes, os neurônios comunicam-se através de impulsos elétricos, cuja duração, tamanho, sequência de estímulos, e outros fatores, determinam o tipo de informação que está sendo carreada. Os neurônios formam malhas neuronais, agrupamentos de células unidas através de sinpases, e cada neurônio pode fazer centenas a milhares de sinapses com outros neurônios próximos. E cada neurônio comunica-se através de um tipo de neurotransmissor, o que indica que em uma malha, há neurônios inibitórios, excitatórios e neurônios que modulam as descargas de outros neurônios.

Os neurônios não se comunicam de forma aleatória. Na verdade, as malhas neuronais possuem um fim, ou seja, a estimulação, ou inibição, de uma via inicial leva a ativação, ou inibição, de neurônios em várias camadas, cuja função é estimular, ou inibir, uma via neuronal final levando a uma ação que pode ser motora (levar um copo à boca, por exemplo), sensitiva (sentir um odor de uma flor, por exemplo), visual (correlacionar imagens com conhecimentos prévios, como exemplo), comportamental (o ato de dormir, como um bom exemplo), cognitiva (pensar, memorizar, raciocinar, e outros atos cognitivos) e outras ações.

Abaixo, uma malha neuronal ligando várias áreas cerebrais em prol de uma ação específica:

http://www.neuroscience.cam.ac.uk/uploadedFiles/mg03_phpGBaO4B.JPG
Entendendo até agora? Podemos manter o barco navegando? Vamos lá.

Além dos neurônios, outras células podem agir no meio celular eletrificado do cérebro. Estas células são as células gliais, mais especificamente os astrócitos, células que possuem várias funções, como suporte nutricional e de defesa neuronal, controle de entrada de substância no cérebro através da barreira hematoencefálica, controle da carga elétrica neuronal, e outras várias funções essenciais, e sem as quais não haveria funcionamento cerebral adequado.

Os níveis de cálcio, potássio e sódio dentro e fora dos neurônios, e dentro e fora das células gliais, é mantido às custas de mecanismos incrivelmente arranjados de forma a propiciar um equilíbrio elétrico celular e uma homeostase (equilíbrio) perfeita. Estes íons (átomos eletricamente carregados) são trocados de forma a manter a atividade neuronal oscilando (sim, a atividade neuronal não é estática, mesmo no sono, mas oscila entre estados ativado, despolarizado, e inativado, repolarizado a hiperpolarizado; leia sobre o potencial de ação, e você entenderá o que estou falando). A função elétrica das células da glia é manter a funcionalidade dos neurônios, através da modulação de sua excitabilidade (deixar o neurônio mais ou menos excitável).

http://cnx.org/content/m47417/latest/Figure_33_02_13.jpg
Acima, um astrócito ligado a um neurônio.

http://esciencenews.com/files/images/201009203716190.jpg

Acima, a demonstração da atividade oscilatória cerebral.

Antes, até há alguns anos, pensava-se que as crises epilépticas eram causadas por um aumento das respostas excitatórias neuronais, e uma falta de neurônios inibitórios, uma visão bastante simplista da realidade.

Na realidade, o problema é bem diferente desta visão minimalista.

Pensemos o cérebro como um meio cheio de neurônios eletricamente carregados, trocando sódio, potássio, cálcio e cloro com o meio externo; células gliais, desesperadas tentanto diminuir as concentrações de cálcio e potássio do meio em que ficam os neurônios para evitar instabilidades elétricas; e os próprios íons, cálcio, potássio, sódio e cloro, sendo trocados de forma passiva e ativa.

Alterações nas concentrações de potássio, e possivelmente cálcio, dentro e fora da célula, desencadearia correntes de oscilações (que, em última análise, seriam as próprias crises) que se espalhariam pelo córtex de forma sincrônica, algo bastante comum em crises epilépticas, e este espraiamento ocorreria não através dos próprios neurônios, mas através das células de suporte, as células da glia, que tamponam, ou seja, acumulam em si os excessos de íons (especialmente o potássio) ao redor dos neurônios. Ou seja, a propagação de uma crise em um local (focal) para outro, e logo para todo o cérebro (generalização) não ocorreria, provavelmente, através de sinapses, mas através de junções elétricas entre as células da glia, as chamadas gap junctions, por onde o espraiamento elétrico é mais fácil e rápido.

http://www.biochemj.org/csb/007/Fig7_astrocyte_structurea.jpg
Nesta linda figura acima, vê-se dois astróscitos unidos pelas gap junctions, fazendo suporte a duas sinapses entre três neurônios, e mantendo o equilíbrio de potássio (K+) no meio extra celular e dentro dos vasos (blood vessels).

A atividade epiléptica é tóxica para os neurônios, e esta leva à liberação de neurotransmissores excitatórios, principalmente o glutamato, levando a maior concentração de cálcio e mais ativação neuronal, alimentando um círculo vicioso que deverá ser parado, em última análise, pela função das células da glia, que tentarão "limpar o ambiente".

Mas como as células gliais entram neste estado de função alterada, podendo auxiliar no desencadear de crises epilépticas?  A propagação e generalização das crises relacionapse com a desregulação do potássio extraneuronal. Já as crises em si podem ocorrer a partir da abertura da barreira hematoencefálica (a barreira formada pelos astrócitos, e que impediria a entrada de qualquer molécula ou substância no cérebro), o que levaria a uma cascata de eventos começando pela ativação dos astrócitos, alteração dos receptores de potássio nos astrócitos, dificultando as correntes de correção de potássio do meio extracelular, e prejuízo da contenção deste excesso de potássio, levando à formação de oscilações que se propagariam entre os neurônios e astrócitos ao redor, ou seja, a um foco epiléptico, que pode ou não se generalizar.

Este é o conhecimento atual simplificado, retirado do livro Oxford Textbook of Epilepsy and Epileptic Seizures, de Shorvon e colaboradores, publicado pela editora Oxford, em 2013.

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