Primeiro, vamos dar nome aos bois. Miastenia significa músculo (mio) + fraqueza (astenia) - ou seja, fraqueza muscular. Já o termo gravis não significa grave, como severo, mas vem de gravidade, ou seja, a tendência de queda em direção ao solo. O que o termo quer dizer é que há fraqueza muscular com dificuldade na movimentação de músculos que funcionam contra a gravidade, como os músculos das pálpebras por exemplo.
Os sintomas que a miastenia gravis (nos referiremos a esta doença a partir de agora como MG) produz são os de fraqueza muscular, ora localizada geralmente na face, mas que pode ficar generalizada. Essa fraqueza é flutuante, ou seja, o paciente até acorda bem, mas a fraqueza vai se instalando ao longo do dia. Nos pacientes mais típicos, a fraqueza começa nas pálpebras e nos olhos, com visão dupla e dificuldade de focalizar as imagens na retina. Esses sintomas podem ser sutis, mas podem evoluir rapidamente para fraqueza mais difusa, e mesmo dificuldade para respirar em casos mais graves. Os sintomas podem, no entanto, ficar restritos aos olhos e à face por anos.
E o que ocorre aqui? Vamos entender rapidamente algo chamado de junção neuromuscular, ou seja, a união entre o nervo e o músculo que ele inerva. O problema da MG está todo aí!
Observe abaixo:
http://www.afh.bio.br/nervoso/img/Nervos5ab.jpg |
Esta figura demonstra um terminal nervoso (um nervo), o axônio, juntando-se ao músculo (o bloco logo abaixo, cheio de pequenas estruturas amarronzadas, as mitocôndrias, que produzem energia). O espaço entre eles chama-se de fenda neuromuscular, e é aqui que o nervo libera substâncias chamadas de neurotransmissores, neste caso, a acetilcolina (ACh), substância que liga-se a proteínas nos músculos, chamadas de receptores, e é daí que se inicia a contração muscular. Complicado? Parece, mas não é!
Observe mais abaixo:
Esta figura demonstra o nervo (em amarelo), cheio de vesículas (bolinhas) cheias de ACh, liberando-as na fenda sináptica, onde elas vão agir sobre os receptores. A ação da ACh sobre os receptores leva à contração muscular (tô me repetindo para que você entenda mais facilmente).
Mas, o que ocorre na MG?
Ora, aqui há um "ataque imune" aos receptores de ACh. Ataque imune quer dizer que anticorpos são produzidos contra os receptores da própria pessoa. Isso mesmo. E os receptores inativados pelos anticorpos param de receber a ACh, ficam parados, e não conseguem fazer o músculo trabalhar. Por isso que pela manhã, o paciente está bem, e por isso que a doença vai piorando ao longo do dia. Por que os receptores que sobraramn, que não foram atacados, estão livres. Mas à medida que os músculos vão sendo recrutados e recrutados, a fraqueza aparece. Por isso que um exercício intenso em um paciente com MG leva a fraqueza mais rapidamente.
Observe abaixo:
http://t3.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcT_ja9FzyFnJ2slf1epPtDnZyMHViKv8OCWy1nLLZ5wi1gmOPOSag |
Nesta figura, o normal está à esquerda, e a MG à direita. Observe que na junção normal, os receptores estão plenamente desenvolvidos e cheios de ACh. Já na MG, os receptores estão "pelados", sem ACh, e estão em menos número, por que os anticorpos os destroem.
Existe alguma relação de MG com alguma doença sistêmica? Sim, algumas doenças autoimunes como lúpus eritematoso podem ter sintomas miastênicos. Há um tumor benigno no tórax, que deve sempre ser pesquisados em pacientes com MG, que é o timoma (tumor do timo), mas às vezes pode ser somente aumento não tumoral do órgão (hiperplasia tímica). Se identificado, sua retirada pode (e eu disse pode) melhorar os sintomas.
Qual o melhor exame para identificar a doença? É a eletroneuromiografia com estimulação repetitiva do músculo examinado a 3 estímulos por segundo, que mostra uma diminuição da resposta do músculo ao longo da estimulação.
A MG tem cura? Não, mas tem tratamento, que permite ao paciente viver bem por muitos anos. O tratamento baseia-se em esteróides e no uso de medicações que inibem a enzima que destrói a ACh na fenda sináptica, a acetilcolinesterase (AChE), assim fazendo com que a ACh fique mais tempo em contato com os receptores. Há também outras medicações imunossupressoras nos casos mais graves.
E lembre-se - este artigo é somente informativo. Qualquer dúvida sobre diagnóstico e tratamento, refira-se ao seu neurologista.
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Comente na minha página do Facebook - Dr Flávio Sekeff Sallem,
Médico Neurologista