Este artigo não discutirá aspectos de tratamento ou prognóstico da doença em questão. Dúvidas a respeito destes assuntos devem ser tirados com o médico que assiste o paciente.
Antes de definirmos o termo em questão, temos de falar rapidamente de tumores cerebrais.
Os tumores cerebrais podem ser didaticamente divididos em primários ou secundários.
Os tumores secundários, os mais comuns tumores do sistema nervoso central (SNC), constituem as metástases cerebrais, tumores de outras regiões do corpo, como mama, próstata, pulmão ou ovário, e que se depositam no cérebro.
Já os tumores primários são lesões expansivas que se originam das próprias células neuronais, as células de suporte (as células da glia) (leia aqui) ou das células de revestimento cerebral, as meninges. Destes, o mais comum é o glioma, tumor que perfaz 65% do tumores primários em adultos, e que se originam das células de suporte (link). Há mais tumores, mas falaremos mais deles em outros posts.
Os gliomas podem ser classificados pelo tipo celular que o constitui, pelo seu grau de diferenciação (ou seja, quão madura é a célula que constitui o tumor, e quanto menos madura, mais invasivo é o tumor) e pela localização.
Por tipo celular:
1. Astrocitoma - São os tumores que se originam dos astrócitos, sendo o glioblastoma multiforme (GBM) o mais comum;
2. Oligodendroglioma - São tumores originados das células que produzem a capa de gordura que envolve os dendritos e axônios (a mielina), os oligodendrócitos;
3. Ependimoma - São os tumores que se originam das células que revestem os ventrículos cerebrais e o canal da medula.
4. Mistos - Mais de um tipo celular
Pelo grau de diferenciação:
1. Gliomas de baixo grau de malignidade - Graus 1 e 2 da OMS;
2. Gliomas de alto grau de malignidade - Graus 3 e 4 da OMS (aqui localizam-se os astrocitomas anaplásicos e o GBM).
Pela localização:
1. Supratentorial - Acima do cerebelo, a localização mais comum de tumores em adultos;
2. Infratentorial - Localizada geralmente no cerebelo, mais comumente vista em crianças.
O cérebro, como já comentado anteriormente (leia aqui e aqui), localiza-se em um compartimento rígido, o crânio. E lesões, mesmo histologicamente benignas, se crescerem de forma rápida e em locais inóspitos, fechados ou que possuem estruturas importantes em seu interior, podem se comportar de forma maligna. Assim, um tumor benigno de tronco cerebral pode causar mais danos que um tumor de crescimento relativamente rápido localizado na superfície do cérebro.
Mas agora, vamos falar do objetivo deste post, o Glioblastoma Multiforme (GBM).
Apesar de ser um tumor comum, sua incidência (quantidades de casos novos) é de somente 2 a 3 por 100,000 pessoas (link). Localiza-se em qualquer lobo cerebral, e é mais comum em pessoas acima dos 50 anos de idade.
Pode produzir sintomas que dependem da localização e da velocidade de crescimento. Assim, os sintomas mais comuns são perda progressiva e severa de memória, mudança de personalidade, crises convulsivas, cefaleia (dor de cabeça), náuseas e vômitos, fraqueza de um lado do corpo (hemiparesia) ou diplopia (visão dupla). O tumor pode produzir sintomas precocemente, mas pode crescer de forma lenta e silenciosa, e levar a sintomas somente quando o tamanho do tumor estiver grande. Mas qualquer doença que leve a compressão lenta ou degeneração cerebral pode dar sintomas semelhantes, de forma que somente um exame de imagem (tomografia ou ressonância) podem dar o diagnóstico de forma mais precisa.
O GBM é mais comum em homens, e não parece haver uma predisposição genética estabelecida, mas talvez haja relação com radiação ionizante (daí o medo com os celulares, que ainda não parece ter fundamentos bem sólidos), e algumas infecções virais (nada com o que se preocupar!). Mas a maior parte é esporádica, ou seja, aparece sem relação real com absolutamente nada da história do paciente.
O seu diagnóstico, primeiro, deve ser precedido por um bom grau de suspeição, ou seja, o médico pensa na doença e solicita o exame que melhor dê o diagnóstico.
Em termos de imagem, o que vemos é o que veríamos se olhássemos para o cérebro in vivo. Há grande quantidade de edema, inchaço local ao redor do tumor comprimindo as estruturas e giros cerebrais ao redor, sangramento, necrose (tecido morto, geralmente no interior do tumor causado por falta de sangue, isquemia) e massa tumoral. Estas características podem ser vistas na tomografia de crânio, ou ainda mais precisamente na ressonância magnética. Há realce com contraste.
Observe imagens de um cérebro normal abaixo:
http://www.mr-tip.com/exam_gifs/brain_mri_transversal_t1_001.jpg |
Esta é uma imagem de um cérebro normal em uma ressonância magnética.
http://homepage.psy.utexas.edu/HomePage/Class/Psy308/Salinas/Disorders/NormalBrain.gif |
Este é um cérebro in natura normal.
Observe abaixo um glioma de baixo grau de malignidade:
http://www.ukb.uni-bonn.de/42256BC8002B7FC1/vwLookupImagesforLoad/Tumor1.jpg/$FILE/Tumor1.jpg |
O tumor localizado na parte direita da figura aparece esbranquiçado em uma imagem em ressonância magnética, sequência T2, demonstrando um conteúdo de água (edema e proteína) no tumor. Os tumores de baixo grau pode ser extensos, como abaixo:
http://imaging.ubmmedica.com/cancernetwork/cmhb13/13_23_Figure2.gif |
Esta é uma ressonância de um glioma de baixo grau, um oligodendroglioma. A diferença para um GBM é que este tumor demorou bastante para chegar neste tamanho. Observe a imagem esbranquiçada gigante do lado esquerdo da figura, o tumor em si, comprimindo as estruturas ao redor, apagando os espaços de líquido (os ventrículos) ao redor, e causando desvio do cérebro.
Observe abaixo um GBM:
https://secure.health.utas.edu.au/intranet/cds/pathprac/Files/Cases/CNS/Case88/Pictures88/G1.jpg |
Tumor de aspecto cístico, com realce ao contraste ao redor da massa (parece um abscesso cerebral, mas é um GBM).
http://anatpat.unicamp.br/Dsc32899++.jpg |
Outro tumor tipo GBM com grande área de edema e desvio de linha média, produzindo uma hérnia, que é quando uma estrutura cerebral atravessa de um compartimento para outro.
Outra figura abaixo de um GBM, mas dessa vez em um cérebro visto ao vivo, para você comparar com o cérebro normal in natura acima:
http://anatpat.unicamp.br/astromacro9++.jpg |
O diagnóstico, muitas vezes, deve ser dado após uma amostra do tumor ser obtida de uma biópsia, uma cirurgia em geral de pequeno porte, e muitas vezes feita com a ajuda de aparelhos, ao que chamamos de cirurgia estereotáxica. Com a biópsia, que deve ser indicada por um neurocirurgião podendo ter o auxílio de um neurologista, pode-se conhecer o tipo celular do tumor, saber que tumor é aquele, e programar o melhor tratamento para ele.
Mais informações, como prognóstico e tratamento, devem ser obtidas em consulta médica.
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Médico Neurologista