segunda-feira, outubro 15, 2012

Genética da doença de Parkinson

A doença de Parkinson (leia mais sobre ela aqui e aqui) é a segunda doença neurodegenerativa mais comum do mundo, e caracteriza-se pelo desenvolvimento progressivo de tremor de repouso, lentidão de movimentos (bradicinesia) e rigidez, com instabilidade postural (quedas ao andar e ficar de pé), além de características não motoras, como perda de olfato, constipação intestinal e alterações de sono.

A doença de Parkinson patologicamente (ao exame do cérebro) caracteriza-se pelo acúmulo de uma substância, chamada de alfa-sinucleína, nas células neuronais de várias regiões cerebrais, principalmente a substância negra (leia mais sobre ela aqui). Esta proteína mal formada e que, por problemas bioquímicos, não consegue ser degradada pelo sistema ubiquitina-proteossoma (o sistema de proteínas que destrói proteínas mal formadas), acumula-se nos neurônios na forma de uma estrutura dentro do citoplasma, o corpúsculo de Lewy. Observe abaixo:

http://www.scielo.br/img/fbpe/rn/v14n1/7572f2.gif
Acima, o sistema ubiquitina-proteossoma. À esquerda, uma proteína mal formada pronta para ser destruída. Essa proteína liga-se a moléculas de ubiquitina, uma proteína que a levará ao sistema proteossoma, um canal de degradação proteica, demonstrado como a "mola" azul e roxa. Após isso, a proteína é destruída em seus aminoácidos específicos, podendo ser estes utilizados em outras estruturas e funções, e a proteína mal formada não se depositará em lugar algum. Essa é a via normal. ATP é a molécula que produz energia na célula quando degradada, e refere-se a Adenosina-Tri-Fosfato (ATP). 

Em algumas doenças, como na doença de Parkinson, este sistema está com problemas, e proteínas depositam-se nas células. Observe abaixo:

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiuidMFtY2O5L-Tn9fJqyQzrRr3RXJOxNDOOHieim6yVgCJ7auJR4eEV4Q5_vNJe50dCAo2ulk9dnIKcK7qhZDb3fgHjVbhncXwh_pUU4EJ5amp_FbiDpTymdsgbCXMWXyeHMa_wE-haoEW/s1600/Corpos+de+Lewy.JPG
Estas bolas amarronzadas dentro dos neurônios são os corpúsculos de Lewy, formados por várias proteínas, entre elas alfa-sinucleína (abaixo) mal formada e não degradada.

http://ucsdnews.ucsd.edu/graphics/images/2009/02-09DecadeOfDiscovery02BIG.jpg
Acima a imagem gerada em computador da molécula não condensada da proteína alfa-sinucleína. 

Muito bem. E já falamos que a doença de Parkinson é uma doença degenerativa, ou seja, há lesão progressiva (ao longo de muitos anos) de várias regiões cerebrais. 

Mas não sei se você sabe, mas cerca de 15% dos casos de doença de Parkinson têm base genética. Sério! (Fonte confiável).

Os genes são os mais variados, e alguns têm inclusive relação com outras doenças, como uma doença de depósito chamada de doença de Gaucher, ou deficiência de alfaglicocerebrosidade (ufa), uma enzima (enzima é toda proteína que tem como função promover reações químicas entre outras substâncias) de uma estrutura celular chamada de lisossomo, cuja deficiência leva a acúmulo de certos tipos de lipídeos, gorduras, em alguns tecido, como o baço, fígado, rins, medula óssea e cérebro.

Mas a maior parte dos genes causa doenças que possuem as mesmas características da doença de Parkinson sem causa, idiopática, que corresponde à maioria imensa dos casos.

Desde 1997, quando o primeiro gene foi descrito (chamado de PARK1, pelo autor grego Polimeropoulos e colaboradores em uma família greco-italiana), vários outros genes foram, e ainda estão sendo descritos. Hoje, temos o PARK1, PARK2, PARK3, PARK5, PARK6, PARK7, PARK8, PARK9  e outras formas genéticas ainda em descrição. O PARK4, caso você esteja se perguntando, é na verdade uma variante genética do PARK1.

Há ainda outras doenças genéticas que podem se manifestar com sinais e sintomas de doença de Parkinson, mas que não são doença de Parkinson, e cuja evolução sugere uma doença totalmente diferente e de tratamento/prognóstico bem diferentes. Entre estas, podemos citar a doença de Machado-Joseph, ou ataxia espino-cerebelar tipo 3 (leia mais sobre ela aqui) e a tipo 2, a doença de Wilson (leia mais sobre ela aqui), a doença de Huntington, e outras doenças.

Ainda, algumas formas de parkinsonismo genético são autossômicas dominantes, e outras autossômicas recessivas (leia mais sobre isso aqui), sendo que as dominantes são aquelas onde somente um gene transmitido de pai/mãe para filho/filha pode causar a doença, ao passo que a forma recessiva necessita de dois genes (recessivos, ou não dominantes) para que a doença se desenvolva.

Entre as formas acima, a forma dominante mais comum, e a mais comumente vista em pacientes com doença de Parkinson aparentemente sem causa é a forma PARK8, que pode se iniciar em indivíduos acima dos 50 anos, e possui uma evolução idêntica à da doença de Parkinson. Já entre as formas recessivas, a mais comum é a forma PARK2, relacionada a um gene chamado de Parkin, e que leva a um quadro de parkinsonismo em jovem, abaixo dos 40 anos, muitas vezes abaixo dos 30 anos de idade, com uma excelente resposta à levodopa, movimentos involuntários causados pela levodopa (discinesias induzidas pela levodopa) precoces, e longa evolução.

Muito bem, é só por este post. Vamos falar mais sobre outros genes em posts posteriores.