domingo, dezembro 01, 2013

Mecanismos de ação - Como age a aspirina na prevenção do derrame?

A aspirina, ou ácido acetilsalicílico, é uma medicação usada há mais de 100 anos (descoberta em 1829, quimicamente isolada em 1853 e comercialmente disponível a partir de 1899, alcançando popularidade durante a famosa epidemia de gripe espanhola após a Primeira Guerra Mundial - leia mais aqui). O seu uso na prevenção de derrames se iniciou entre as décadas de 60 e 80 do século passado. 

A aspirina além de um potente anti-inflamatório é, hoje, a droga mais comumente usada na prevenção de AVC's no mundo. Mas como a aspirina age? Antes de conhecermos o mecanismo de ação da aspirina, temos de entender como se forma uma placa de ateroma, que pode acabar produzindo o derrame. 

Abaixo, conheça uma célula de extrema importância e que mora no seu sangue, a plaqueta:

http://wehelpwhathurts.homestead.com/platelets.jpg
As plaquetas são as responsáveis por uma parte da cicatrização de feridas e da coagulação do sangue. Como você vê acima, as plaquetas são células especializadas que aderem, grudam-se, umas às outras formando redes nas regiões lesadas dos vasos sanguíneos, ativando-se e liberando substâncias que ativam mais plaquetas ao redor, chamando-as para fazer a primeira linha de reparação do vaso e hemostasia (hemostasia é a parada de um sangramento).

Fora isso, e com a ajuda de outras substâncias liberadas pelo próprio vaso danificado, há a formação de um coágulo, que é formado por uma proteína chamada fibrina (que é ativada, ou seja, posta para funcionar, através de uma via, da qual poderemos falar depois, a via de coagulação). A fibrina liga-se às plaquetas, reforçando o agregado plaquetário e prendendo este conjunto de plaquetas à parede do vaso, danificada. Com a cicatrização, há a remoção deste agregado de plaquetas e fibrina.

Observe abaixo o que disse em uma figura:

http://cnx.org/content/m44804/latest/Figure_40_02_04ab.jpg
Em (a), o megacariócito é a célula da qual derivam as plaquetas (platelets). Em (b), fibrin clot é o coágulo de fibrina, formando-se na parede do vaso rompida.

Muito bem, adiante.

As plaquetas são, logo, fundamentais para a reconstrução da parede danificada de um vaso, e logo, para evitar sangramentos. Por isso que quem toma aspirina ou outros antiagregantes plaquetários tem tanto sangramento da gengiva quando escova os dentes, ou pequenos sangramentos da pele (as equimoses) quando batem em algo, ou mesmo espontaneamente.

Outro protagonista importante na formação da placa de ateroma, a famosa placa de gordura que se forma na parede dos vasos, é o próprio revestimento dos vasos, o endotélio. Observe abaixo:

http://faculty.stcc.edu/AandP/AP/imagesAP2/bloodvessels/endothelia.jpg
Acima, há o endotélio do vaso, a parte mais interna do vaso e que fica em contato com o sangue. O endotélio é formado por várias células que funcionam como um órgão separado, produzindo várias substâncias, em especial o óxido nítrico, que mantém o diâmetro do vaso e permite a circulação do sangue. Um endotélio saudável significa um vaso saudável.

http://www.chelationhealthproducts.com/images/diagram-endothelium.jpg
À esquerda, vemos um vaso saudável como um endotélio saudável. À direita, um vaso danificado, com uma placa de ateroma, de colesterol, formando-se na superfície interna do vaso e estreitando a luz do vaso, impedindo a passagem de sangue.

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/4/48/Carotid_Plaque.jpg/230px-Carotid_Plaque.jpg
Esta é uma placa de colesterol de verdade retirada de uma carótida que estava entupida. Feia, não?

Pois bem, há outro ator nesta comédia de erros. É o excesso de colesterol, mais especificamente o LDL, a Lipoproteína de Baixa Densidade ou colesterol ruim, que em excesso danifica o endotélio e se acumula na parede do vaso, provocando inflamação. Sim, inflamação. Inflamação esta que evolui ao longo dos anos, e que pode piorar com alguns adjuvantes a mais, como deficiência de vitaminas, cigarro (fumo!), pressão alta e diabetes descontrolado.

E qual é a célula que, atraída por várias substâncias inflamatórias produzidas no endotélio lesado, aumenta a placa e promove mais inflamação? A plaqueta, que vimos acima.

As plaquetas não aparecem no começo da formação da placa, como sugere um artigo publicado na famosa revista Circulation Research de 2002 (link). E mais, elas auxiliam na produção de uma proteína importante, a beta-amilóide 42, envolvida na doença de Alzheimer.

Fora isso, a relação entre as plaquetas e outras células inflamatórias encontradas nas placas de colesterol, como os macrófagos, acabam também por produzir radicais livres, que lesam ainda mais os vasos.

Logo, a plaqueta possui papel importante na manutenção da placa de ateroma e nos eventos isquêmicos (ou seja, nos derrames e nos infartos do coração), de modo que a inibição da agregação das plaquetas através de substância que se liguem a seus receptores diminuiria a frequência de doenças causadas pelas placas de colesterol.

Claro que os antiagregantes plaquetários, como a aspirina, mas também o clopidogrel e o cilostazol, não impedem tudo, pois como vimos, a presença das plaquetas ocorre quando a placa já está formada. Há a necessidade de evitar a formação da placa de colesterol através de hábitos saudáveis de vida, diminuir a inflamação vascular através de exercícios físicos, evitar o colesterol elevado através de dieta saudpavel, ou diminuir os níveis de colesterol, ou através de dieta, ou através do uso de estatinas, medicações utilizadas para este fim e que devem ser prescritas por médicos.

Por fim, não use aspirina ou qualquer antiagregante plaquetário sem orientação médica. Como toda medicação, a aspirina pode levar a sérios efeitos colaterais e mesmo alergias, e somente o médico ciente do seu problema tem a capacidade de julgar a necessidade do uso da medicação.