terça-feira, maio 13, 2014

O que seria de você sem o labirinto?

Inicialmente, o que é o labirinto? Há um post no blog sobre isso aqui. Mas vamos fazer uma breve revisão.

Olhe atentamente as figuras abaixo:

http://www.earsite.com/sites/default/files/userfiles/images/general-anatomy/ga1--temporal-bone-anatomy.jpg
http://apbrwww5.apsu.edu/thompsonj/Anatomy%20&%20Physiology/2010/2010%20Exam%20Reviews/Exam%204%20Review/15-27_Labyrinth.JPG
Na figura de cima, vemos o ouvido, e dentro dele as estruturas que controlam o equilíbrio (o labirinto e os órgãos otolíticos) e a audição (cóclea). Os ossículos (estribo, bigorna e martelo) funcionam com meio de transferir a energia do som que se choca contra o tímpano (eardrum) para o ouvido interno.

Já na figura de baixo, vemos em mais detalhe estes órgãos. O labirinto com seus canais anterior, posterior e lateral, os órgãos otolíticos (sáculo e utrículo) e a cóclea. Estes órgãos são minúsculos, seu conjunto sendo um pouco maior que a unha do seu dedão da mão. 

E são estes minúsculos conjuntos de ossos e membranas que controlam nosso equilíbrio e nossa audição.

Imagine que você está correndo na rua, exercitando-se, e vê uma placa na sua frente. Você consegue ler o que está escrito na placa sem parar de correr? Se sim, seu labirinto funciona muito bem. Há pessoas que não conseguem, ou por que sentem enjôo e tontura (ou seja, o conjunto labirinto-cérebro não está adaptado para fixar coisas em movimento), ou você tem doença dos dois labirintos, o que ocasiona perda da capacidade de focalizar coisas em movimento.

Se seu labirinto não funcionasse dos dois lados, seria isso que você veria se estivesse correndo:

Otoneurologia Atual - Zuma e Maia et al, 2014

Estranho não?? Isso ocorreria porque você perderia a capacidade de fixar a imagem na retina enquanto sua cabeça pula, literalmente, para cima e para baixo enquanto você corre ou anda. Quem faz isso, corrige distorções de movimento de forma tão rápida, é o labirinto. 

Olhe para a tela do computador, e fixando em um ponto dela vire só sua cabeça, ora para um lado, e depois para outro. A tela se move? O labirinto possui uma velocidade de resposta a estímulos visuais muito rápida, mais rápida do que o próprio sinal visual (o labirinto demora 15 milissegundos ou ms, ou seja, 15/1000 segundos, para responder a uma modificação de posição da cabeça, enquanto as vias visuais demoram 70 ms). 

Mas voltando ao nosso experimento, quando você vira a cabeça, a tela se move? Se não, é porque seu labirinto mantém a imagem fixa para que você não a perca. E isso ocorre dos dois lados. E isso é normal. Isso ocorre também ao abaixar ou levantar a cabeça com os olhos fixos em algo. Isso é necessário para que saibamos o que está ocorrendo sem desviar a atenção do ambiente, e também como forma de proteção contra estímulos agressivos externos (se fossemos homens da caverna caçando presas e fugindo de tigres dentes-de-sabre (fale esse nome rápido, sem respirar, três vezes!!)). Nesse experimento, nosso cérebro participa também, pois duas áreas cerebrais, uma área frontal e outra parietal, participam do controle do labirinto e dos movimentos lentos da cabeça. 

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgjRGezPgCNQgVgz3qSI4vyyEZ9Mdjoybrk4pcXIFMGDleX7HCQzd2JvHDg8mrItWVAIyPkg3STB1QVyJnfd779yz0zJhrW2XBahP1Jm7BYAzaxMIOVWtAA69TjjBqTHHTBZ39AMrB4MH64/s1600/humanlobes.gif
Voltaremos a falar mais sobre isso em outros posts. 

terça-feira, maio 06, 2014

O hipocampo e a atividade aeróbica

O hipocampo, biologicamente falando, é um cavalo-marinho ( que, apesar do nome, é um peixe). 

http://www.somso.de/img/zos2001.jpg
Bonito, não? Já peguei uns dois desses na mão quando fui a Fernando de Noronha, para desespero do guia (eles estão bem, apesar de mim). Mas continuemos.

No cérebro há também um hipocampo, mas esta é uma estrutura que fica no seu lobo temporal e a principal estrutura relacionada com o armazenamento das memórias. 

Hum? Um cavalo-marinho é o responsável pelas minhas memórias???? Não é bem assim! Observe um hipocampo cerebral.

http://idosos.com.br/wp-content/uploads/2012/05/hipocampo202.jpg
Eu sei o que você está pensando! O Dr Flávio tem uma imaginação porreta para dizer que isso aí parece com um hipocampo! Mas não fui eu quem disse isso, eu só propago o conhecimento. Imaginação teve quem achou, pela primeira vez, que isso tinha a forma de um hipocampo. Mas esta estrutura tinha de ter um nome, e ficou hipocampo (em inglês, hyppocampus).

Mas é aqui que as memórias são armazenadas quando chegam ao cérebro. No lobo temporal. E aqui chegamos ao nosso texto.

Notícia tirada do site Medscape News, e traduzida livremenre para o Blog Neuroinformação.

O treino aeróbico aumenta o volume do hipocampo em pacientes com declínio cognitivo leve. 


Nota do Tradutor: Antes de começar, só uma nota explicativa. O declínico cognitivo leve (em inglês, MCI para Mild Cognitive Impairment) é uma condição em que há alteração na memória, ou menos frequentemente em outras áreas da cognição, mas sem causar impacto sobre a vida do indivíduo, ou seja, sem ser demência. Em 5 anos, 50% dos pacientes com MCI evoluirão para demência, na sua maior parte tipo Alzheimer. Mas vamos ao texto.

Mulheres idosas com MCI que se submetem a um programa de atividade física aeróbica por 6 meses têm aumento no volume do hipocampo comparadas a mulheres que fazem somente exercícios de tonificação muscular. Mas este aumento, especialmente do hipocampo do lado esquerdo, conforme visto no estudo em questão não se associou com melhora da performance no testes de memória verbal.

Os achados deste estudo sugerem que a atrofia (diminuição de tamanho) do hipocampo, achado típico da doença de Alzheimer, isolada não explica tudo o que ocorre nessa doença. Também, pode haver um intervalo de tempo entre o aumento do volume do hipocampo e uma modificação na função cognitiva. Ou mesmo, as pessoas que obtiveram melhor aumento do hipocampo foram as que tinham a estrutura mais atrofiada no início do estudo, e com o tempo acabaram igualando-se com outras pessoas no teste de memória verbal, o que poderia explicar a falta de melhora evidente.

Além da atrofia do hipocampo, alterações da substância branca cerebral podem contribuir para a perda de memória e para defeitos de conexão entre o hipocampo e outras áreas do cérebro, e nesse caso, aumentando o volume hipocampal isoladamente não melhoraria a memória.

O artigo foi publicado no British Journal of Sports Medicine (link aqui).

O estudo avaliou 86 mulheres entre 70 e 80 anos de idade com algum problema de memória mas sem demência. Os treinos foram de 60 minutos de duração, duas vezes por semana. 

Foram feitas avaliações da memória com dois testes, um de memória verbal (lembrar o que foi falado ou ouvido antes) e um de memória imediata (lembrar palavras após lê-las 5 vezes e após um teste de distração). 

O hipocampo nos pacientes em exercício aeróbico aumentou 5.4% à esquerda e 2.5% à direita (total de 4%).

A atividade física aumenta os níveis de um fator de crescimento do sistema nervoso, o Brain-Derived Neurotrophic Factor (BDNF) ou Fator de Crescimento Derivado do Cérebro, com aumento da criação de novos neurônios (neurogênese) no hipocampo e aumento das sinapses, as ligações entre os neurônios.

O que os autores sugerem é que a atividade física, conforme estudos anteriores, pode auxiliar mais quem já possui algum tipo de déficit, comparado com o estudo atual.

Os autores dividiram os pacientes no final em grupos (Hipocampo grande, pobre memória; hipocampo grande, boa memória; hipocampo pequeno, boa memória; e hipocampo pequeno, pobre memória). Talvez o ideal seja verificar nestes pacientes outras variáveis, como qualidade de vida, risco de desenvolver demência no futuro e sobrevida após o estudo.

Mas como sempre, mais estudos são necessário.

Muito bem, o tradutor (eu) sugere que atividades físicas sejam sempre realizadas, mas sempre com apoio médico e do profissional de educação física/fisioterapia, e nunca sem uma avaliação médica prévia, especialmente em indivíduos idosos.

Atividade física e a doença de Alzheimer

Quando seu médico fala para você fazer atividades físicas, especialmente se você tem mais que 60 anos de idade, que cara você faz? Fica alegre e exultante? Faz cara de alegrinho, mas chora por dentro? Faz cara de bravo e sai do consultório batendo porta? Ou não volta mais ao médico?

Pois bem, este post lida justamente com isso, atividades físicas. E ratifica algo que sempre falo nos posts, nas minhas entrevistas na TV, jornais e rádio, e no Facebook.

Notícia tirada do site Medscape News, e traduzido livremente para o Blog Neuroinformação.

Exercícios aeróbicos preservam a congnição em idosos não demenciados


A atividade aeróbica contínua (andar, andar de bicicleta, correr, trotar) tem um efeito proteror sobre o estado cognitivo (mente) e sobre a velocidade psicomotora (pensar e fazer algo voluntariamente) de idosos sem demência. 

Os autores de um novo estudo publicado na 66º Congresso da Academia Americana de Neurologia, que terminou ontem, sugerem atividade de baixo impacto diária em pessoas idosas que sejam capazes de realizá-las (Nota do tradutor: Aqui, deixo claro que há a necessidade de uma avaliação clínica e cardiológica, e muitas vezes ortopédica, antes de realizar qualquer atividade física nesta idade pelos riscos de complicações que podem surgir).

Os autores estudaram 39 idosos, com idade média de 77.94 anos. Vinte e dois fizeram parte do grupo que praticou atividade física, e 17 fizeram parte do grupo controle. O exercício durou pelo menos 15 minutos (pouco tempo, certo?) na forma de bicicleta ergométrica diariamente por 15 meses, com uma média semanal de 134.21 minutos de exercício, ou 18 minutos por dia mais ou menos. Os idosos do grupo controle não realizaram atividades físicas, mas ficaram lendo ou jogando cartas.

Foram realizados três testes de funções mentais cognitivas. O estudo demonstrou que houve uma melhora do estado cognitivo geral dos pacientes que praticaram atividade física. Já o grupo controle piorou (poderia estabilizar o estado cognitivo, mas piorou, o quer dizer mau sinal). 

Já a avaliação picomotora também melhorou significativamente nos pacientes que fizeram atividades físicas. A única função em que não se observou melhora foi no teste de memória e aprendizado. 

Os autores sugerem que a prática de atividades físicas tem efeito neuroprotetor sobre a cognição e velocidade de pensamento em idosos não demenciados. 

Talvez os efeitos da atividade física sobre o cérebro sejam decorrência de seus efeitos benéficos sobre o coração, pelo aumento do fluxo de sangue e oxigênio para o cérebro. Claro que a associação com uma dieta balanceada, atividade mental e social contínua ajuda a melhorar mais ainda a cognição nestes pacientes. E o que importa é que a atividade seja regular, ou seja, diária. 

Mas, como sempre, mais estudos com mais pessoas são necessários. 


sexta-feira, maio 02, 2014

A relação inusitada entre Vitamina C e neurologia

Linus Paulling foi um químico americano, ganhador de 2 prêmios Nobel. Ele defendeu o uso da vitamina C como medida para prevenir e tratar doenças, e quase aos 70 anos, em 1970, publicou trabalho em importante revista internacional sobre os seus efeitos na saúde (leia aqui). No entanto, muitas de suas ideias não são levadas a sério até hoje. Bem, até hoje.

A vitamina C, ou ácido ascórbico, é um potente antioxidante, e pode ser utilizado no controle do estresse oxidativo, ou seja, produção de radicais livres e inflamação, que ocorre com muitas doenças crônicas, como a pressão alta. 

Artigo publicado no site da Medscape News e traduzido livremente para o blog Neuroinformação.

Baixas concentrações de Vitamina C ligadas a hemorragia cerebral

Um novo estudo descobriu uma associação entre baixas concentrações de Vitamina C e aumento do risco de derrame hemorrágico (AVC hemorrágico ou AVCH). 

Os pesquisadores descobriram que baixas doses de vitamina C eram mais comuns em pacientes portadores de AVCH do que em pessoas sem doenças (controles). Isso provavelmente deve-se ao fato de a vitamina C estar associada ao controle da pressão arterial e da síntese do colágeno (a proteína estrutural que compõe praticamente todos os tecidos de conexão no corpo, inclusive a parede dos vasos, e se este colágeno for fraco ou mal formado, pode levar a fraqueza da parede dos vasos e sangramentos). 

Ou seja, este estudo servirá como base para outros estudos que testarão a eficácia da  suplementação de vitamina C em prevenir AVCH e diminuir as complicações dos pacientes que apresentam esta condição.

Este estudo foi apresentado no 66º Congresso da Academia Americana de Neurologia, que está terminando este final de semana, na Filadélfia, EUA.

O estudo avaliou 135 participantes, sendo que 41% destes tinham dosagens normais no plasma de vitamina C, e 14% estavam deficientes em vitamina C. A concentração desta vitamina estava significativamente baixa nos 65 pacientes que haviam tido um AVCH espontâneo (ou seja, não causado por ruptura de aneurismas ou de malformações vasculares, e nem por sangramento de tumores cerebrais). 

Claro que os fatores de risco para o AVCH foram pressão alta, uso de álcool e obesidade, além de idade mais avançada no caso de hemorragia na parte mais externa do cérebro (lobar, nos lobos cerebrais). A falta de vitamina C, também, aumenta o risco de aterosclerose e doenças do coração, além de pressão alta.

O estudo sugere mesmo que as pessoas que tinham maiores concentrações de vitamina C ficaram menos tempo em UTI (metade do tempo em relação às pessoas que tinham concentrações baixas de vitamina C), o que pode estar relacionado a complicações por infecções nos pacientes, ou por lesões de pele, como úlceras de pressão e escaras (aquelas feridas que se formam nos pés, bacia e costas quando a pessoa fica muito tempo deitada em uma mesma posição), talvez por conta do déficit de colágeno. 

Claro que mais estudos são necessários para fechar essa conclusão da associação entre vitamina C e AVCH, mas parece que as deficiências de vitamina C devem ser tratadas como se tratam outras deficiência de vitaminas, através da suplementação indicada por médico e do aumento do consumo de vegetais e frutas ricas em vitamina C (leia aqui), o que por si só, em pessoas saudáveis, já é mais do que suficiente.