sábado, junho 22, 2013

Síndrome de Lennox-Gastaut

Em 1950, dois autores (Lennox e Davis) descreveram um padrão de ondas lentas no eletroencefalograma (EEH) (2 ciclos por segundo ou 2 Hz [Hz significa Hertz], diferente da frequência normal no EEG de 9 a 11 Hz) associado a retardo mental e tipos específicos de crises epilépticas (crises tônicas, onde há contrações sustentadas dos membros, crises atônicas, onde há queda com perda da contração muscular normal, crises mioclônicas, com abalos [mioclonias] musculares, e crises de ausência atípica, onde há alterações graves de consciência com abalos, diferentes das crises de ausência típica encontradas em crianças).

Em 1966, o famoso epileptologista francês Henri Gastaut (veja figura abaixo) descreveram a síndrome inicialmente descrita por Lennox e Davis em 100 pacientes com os mesmos achados de EEG. A esta síndrome, chamou-se inicialmente encefalopatia epiléptica da infância com pontas-ondas lentas difusas (sim, sei, é um nome difícil, mas vamos tentar explicar).

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Acima, uma fotografia de Henri Gastaut. 

Encefalopatia, como já visto em vários posts deste blog, é uma doença crônica ou aguda do cérebro. Epiléptica porque há crises epilépticas como manifestações principais da síndrome. O termo ponta-onda designa um achado muito comum em EEG’s de pacientes com epilepsia, denotando a onda de excitação/inibição cerebral das crises epilépticas (ponta e onda, onde a ponta é maior e mais rápida, e a onda, que vem depois, menor e mais arredondada – veja abaixo). A lentidão, como já visto, advém do fato de estas pontas-ondas terem frequência de 2 por segundo (ou 2 Hz), e são difusas porque estão presentes em todo o traçado do EEG.

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Acima, o traçado eletrográfico de uma criança com SLG. Observe as pontas, traços finos e rápidos em todo o traçado, seguidas de ondas, mais lentas e arredondadas. Cada espaço entre duas linhas verticais delimita 1 segundo. Observe que há rigorosamente 2 a 3 destes complexos ponta-ondas por segundo (basta contar quantos complexo há entre duas linhas verticais) ou 2 a 3 Hz. 

Posteriormente, a síndrome recebeu o nome de síndrome de Lennox-Gastaut (SLG), em homenagem aos seus descritores. A SLG é classificada como uma epilepsia generalizada, sem foco definido, de causa conhecida ou desconhecida (criptogênica).

A SLG constitui-se em uma forma grave de encefalopatia epiléptica, e pode desenvolver-se em cerca de 30% dos pacientes a partir da síndrome de West, descrita no post anterior. As crises podem ocorrer no sono, com o paciente acordado (e as crises atônica podem levar a queda súbita ao chão), além de retardo de desenvolvimento mental. Alguns pacientes podem ter lesões cerebrais difusas.

A SLG não é uma doença, mas uma síndrome, e como a síndrome de West, pode ocorrer por conta de várias causas diferentes, desde lesões cerebrais a casos sem causa definida, apesar de uma investigação ampla.

Ocorre mais em meninos, geralmente se inicia entre os 2 e 8 anos de idade, e raramente ocorre depois da infância. É responsável por 5% das epilepsias em todas as idades, e por 10% das epilepsias em pessoas abaixo de 15 anos de idade.

Em 1/3 dos casos, não há história alguma de lesão cerebral, assim como não há, ainda, evidência de predisposição genética. Os 70% restantes relacionam-se a danos cerebrais, principalmente durante o período pré-natal ou neonatal (logo após o nascimento), como incompatibilidade de sangue (grupo ABO ou Rh), prematuridade e problemas relacionados a isso (uma minoria dos prematuros, deve-se ressaltar, evolui para a SLG), trabalho de parto prolongado, circular de cordão, anóxia perinatal, malformações cerebrais (a principal é a esclerose tuberosa, ou doença de Bourneville). Outras causas pós-natais são infecções cerebrais, como meningites e encefalites, doenças metabólicas do cérebro, derrames em neonatos (em geral por problemas de parto), hipoglicemia grave, e outras causas.

Os vários tipos de crises ocorrem na maioria dos pacientes. Crises de queda (crises atônicas ou astáticas), alterações de comportamento, alterações mentais e distúrbios de personalidade podem ser sintomas iniciais da síndrome. O retardo mental é invariável, podendo ser mais ou menos grave dependendo da idade de início da síndrome (casos mais tardios apresentam alterações mais leves de cognição). O exame neurológico pode ser normal em 17% dos pacientes.

O diagnóstico é clínico, pela tríade de vários tipos de crises, retardo mental e padrão típico do EEG. Como a SLG não é uma doença, a causa será determinada pela história clínica, pelo exame físico, e por exames laboratoriais e de imagem que o neuropediatra julgar necessários.

Com relação ao tratamento, há técnicas farmacológicas (com medicações) e não farmacológicas, com várias drogas disponíveis. No entanto, o tratamento síndrome não será discutido aqui, e reservaremos posteriormente um post para falar das mais diversas formas de tratamento de epilepsias. 

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Comente na minha página do Facebook - Dr Flávio Sekeff Sallem,
Médico Neurologista